Texto: Rubim Almeida* | Foto: Marta Pinto |
O castanheiro é uma planta de folha caduca pertencente à mesma família de carvalhos e faias (FAGACEAE).
É uma espécie arbórea capital associada à actividade humana. As suas magníficas proporções e os seus múltiplos usos tornam o castanheiro numa das mais importantes plantas culturais da história e do tempo.
Ainda que a sua origem geográfica continue a ser debatida, criou-se o mito de que teriam sido os Romanos a introduzir esta espécie, bem como o seu cultivo. Contudo, os registos polínicos (ainda que pobres em certos casso) demonstram que há cerca de 7.000 anos já os castanheiros se encontravam bem presentes na flora do Noroeste da Península Ibérica. E se quisermos recuar ainda mais no tempo, é possível afirmar que Castanea sativa terá chegado à Península Ibérica ainda durante o período Neogénico, vindo da Ásia, podendo hoje afirmar-se (de forma provocativa) que esta espécie possui um carácter autóctone.
Ainda que não existam dados sobre quando se terá sido iniciado o cultivo sistemático da espécie, é muito possível que tenham sido os Romanos a introduzir essa noção de “fileira”, de “cultura”. A produção de frutos ter-se-á desenvolvido posteriormente podendo ser associada às estruturas e necessidades socioeconómicas dos tempos medievais.
Em Portugal continental a sua área preferencial de distribuição é o Norte e o interior da região Centro preferindo como habitat os lugares frescos de regiões montanhosas, podendo atingir os 1.800m de altitude e tendo preferência por solos siliciosos e soltos.
Da sua morfologia pode-se dizer que se trata em geral de árvores altas (até 30m) de copa regular, direita, elipsoidal e frondosa. As suas folhas, simples e alternas, são lanceoladas de margem serrado-dentada ou serrada, podendo alcançar os 25 cm de comprimento, apresentando nervuras regulares e bem vincadas.
As flores dispõem-se em amentilhos (tal como nos carvalhos) que podem alcançar os 30 cm de comprimento; os superiores andróginos (com flores masculinas e femininas) e os inferiores masculinos. As flores femininas situam-se na base dos amentilhos que integram. Os frutos comestíveis (castanhas) são produzidos no interior de um invólucro espinhoso (ouriço) em grupos de 1 a 3, mais raramente 4.
Em toda a Europa (incluindo a região Norte da Península Ibérica), as castanhas foram durante séculos um importante alimento das populações, devendo ter sido um dos mais importantes alimentos, por exemplo, para peregrinos (eg. Caminhos Portugueses de Peregrinação a Santiago).
A castanha é um fruto rico em hidratos de carbono, podendo ser consumido de muitas e variadas formas: cru, em puré, sob a forma de farinha (pão, bolos, etc.), sopas, assada, cozida ou até crua.
Consumida em toda a Europa e parte da Ásia, a castanha fez parte da alimentação diária de muitos povos, durante milénios (nomeadamente na Itália e na Córsega), substituindo os cereais ou mesmo a batata nos locais em que aqueles cultivos não cresciam nas melhores condições.
Sobre este fruto conta-se que fazia parte da dieta Romana, sendo que os soldados se alimentavam de um puré de castanha antes dos combates, que Alexandre, o Grande terá plantado castanheiros em toda a Europa ao longo das suas campanhas ou que o exército grego sobreviveu durante a sua retirada da Ásia menor (401-399 AC) devido às suas reservas de castanhas.
Também precisamente pelo elevado conteúdo em glícidos, foi durante muito tempo usada para produzir o amido que era usado para engomar têxteis.
No que à sua madeira concerne, o castanheiro produz madeira de alta qualidade, muito apreciada na construção, pela sua durabilidade, beleza e resistência à humidade sendo ainda utilizada em carpintaria, tanoaria e cestaria. Os usos desta madeira são muitos e variados de acordo com as diferentes culturas, hábitos e tradições. Em Itália, por exemplo, são de madeira de castanho os barris onde se envelhece o vinagre balsâmico tão na moda e dela se extraiam também os taninos usados na indústria das peles, no Reino Unido foi durante muito tempo usado em cestaria e na produção de carvão vegetal e, nos Estados Unidos, na produção de cosméticos, sobretudo champôs.
Curiosamente, tratando-se de uma espécie tão importante do ponto de vista social e económico, desde a antiguidade, é de estranhar que pouca seja a mitologia associada a esta planta. Do pouco que se conhece, sabe-se que os gregos dedicavam os castanheiros a Zeus e que foram quem criou o nome “Castanea”, o qual poderá ter tido origem numa cidade Tessalónica designada “Castonis”. Diz-se, ainda, que a deusa Artemísia escapou a Zeus ao transformar-se num castanheiro escondido no meio da floresta e, em certas regiões da Itália, diz-se às crianças que os bebés “vêm das castanhas”.
Não se esqueça que, diz a lenda que S. Martinho, um soldado romano, num dia de neve e vendaval, viu um mendigo cheio de frio, a pedir esmola. O soldado, então ainda não Santo, parou o cavalo e, com a sua espada, cortou metade da sua capa e deu-a ao mendigo, seguindo caminho. Subitamente, a tempestade desfez-se e o Sol aqueceu o cavaleiro. Daí a lenda do Verão em pleno Outono, associado a S. Martinho. Seja como for, quando chegar o S. Martinho, nada como umas boas castanhas assadas acompanhadas por uma boa água-pé, à moda do Sul, ou por boa jeropiga mais à moda do Norte.
Bibliografia:
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García-Amorena, I., Gómez Manzaneque, F., Rubiales, J.M., Granja, H.M., Soares de Carvalho, G. & Morla, C. 2007. The Late Quaternary coastal forests of western Iberia: A study of their macroremains. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology, 254: 448–461
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Tereso JP, Ramil Rego P, Almeida da Silva R. 2011. A exploração de recursos alimentares silvestres e seu enquadramento nas dinâmicas económicas e sociais das comunidades agrícolas desde a pré-história à época romana. In Tereso JP, Honrado JP, Pinto AT, Rego FC (Eds.) Florestas do Norte de Portugal: História, Ecologia e Desafios de Gestão. InBio – Rede de Investigação em Biodiversidade e Biologia Evolutiva. Porto. ISBN: 978-989-97418-1-2. Pp 55-83
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* Este texto resulta de uma colaboração graciosa do Professor Doutor Rubim Almeida com o FUTURO – projeto das 100.000 árvores na Área Metropolitana do Porto. O Professor Doutor Rubim Almeida é docente e investigador na área da botânica na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, onde é coordenador do Mestrado em Ecologia, Ambiente e Território. Integra o CIBIO / INBIO.[/fusion_builder_column][/fusion_builder_row][/fusion_builder_container]