A Epopeia de Gilgamesh é considerada o primeiro sopro literário do ser humano. A obra foi descoberta no século 19 e sabe-se que foi escrita há 35 séculos, na Mesopotâmia, em pequenas pranchas de argila (imagem). Esta epopeia é constituída por 3.000 versos e conta a vida do grande rei Gilgamesh, senhor das terras de Uruk, em busca da sua imortalidade.
Um dos episódios da Epopeia de Gilgamesh é conhecido como ‘a jornada ao bosque’ e constitui igualmente a primeira parábola ecologista que se conhece.
Sucintamente a estória conta que Gilgamesh queria ser ‘um homem imortal’ e acreditava que atingiria esse estado construindo uma grande cidade. Mas para alcançar esse ambicioso objetivo precisava de madeira. Na terra de Gilgamesh existia um imenso bosque de cedros, mágico e intacto, cujos limites não se conheciam pois nunca ninguém tinha ousado entrar.
Enlil, o supremo deus sumério, tinha encomendado ao semideus Humbaba a proteção dos interesses da natureza e deste bosque de cedros em particular. E Humbaba protegia o bosque com todas as suas energias, podendo até ser cruel. Mas Gilgamesh não se deixou intimidar. Guiado pela sua ambição, ele e os seus homens carregados de ferramentas entraram no bosque determinados a eliminar Humbaba e levar toda a madeira do bosque. A luta foi feroz mas Humbaba acabou por perder a batalha contra a civilização e os cedros gemeram porque sabiam o que os esperava (‘podia ouvir-se a uma légua a triste canção dos cedros’). Em pouco tempo as árvores foram todas cortadas e as montanhas ficaram nuas. Ao ter conhecimento do sucedido, o deus supremo Enlil, lançou uma série de maldições à civilização: ‘que a vossa comida seja devorada e que a vossa água seja bebida pelo fogo’.
Este episódio da Epopeia de Gilgamesh é uma mostra que os seus autores não ignoravam as consequências da desflorestação, nomeadamente na degradação do solo e no ciclo hidrológico. E a história real demonstra-nos que esta estória acabou por passar da ficção à realidade e teve como consequência a decadência da civilização suméria (~2.000 a.C.).
Texto: Marta Pinto